lunes, 16 de abril de 2018

Não te mixa, lagartixa meu amor (rascunhos, excertos)

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Adoro lagartixa. Tive uma lagartixa amiga do peito, inicialmente arredia ficava pela parede em raras aparições públicas pela madrugada, enquanto eu batia máquina no covil IV da Av. Oscar Pereira, a gente lá cercados de cemitérios. 

Os vizinhos com dez abaixo-assinados pra me expulsar a pretexto do ruído da máquina de escrever tarde da noite. Na verdade não confiavam nas suas senhoras. Filhos da puta, comi umas vinte mulheres deles naquele pombal, sem jamais ter dado em cima de nenhuma, nem olhava, elas que vinham. 

Teve a mulher de um alemão que me pegou num feriado, o alemão tava trabalhando, e disse sem pudor: quero foder contigo. Vai ser grossa e despudorada assim na casa do caralho, pensei, mas passei o pau na dama, o marido era um maldoso chiclé. Quando falei, assim, mete, vagabunda, imagine que o teu marido corno está olhando, ela por cima, a boboca se acabou toda.

Com o tempo a Branca, nome que dei à lagartixa que tomou o meu apartamento como sua moradia, deu de aparecer mais, em dias de chuva, até que se soltou em confiança. Toda fresca me botava a língua, gozando da minha cara, mandando eu sair, pra que ficar tão triste, rapaz? Arrume outra mulher, uma cantora ou atriz, as crianças estão bem, pare de escrever tristezas, vá viver a vida...

Em três anos e três livros, e alguns vinhos, ela falava comigo, de maneiras que tirem o chapéu pra mim, indiada amiga, pois além de esperanto, chinês (de chinas, nem todas) e gatês, também falo lagartixês.

Só não falo inglês. Arranho no português. 

Quando ela sumiu, e pensei o pior, vendi o apartamento por um terço do que valia, me mudei daquele ambiente hostil onde só ela me amou.


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