viernes, 5 de febrero de 2016

ADIÓS NONINO

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Sabe, Bet, o ano de 1992 para mim foi muito ruim, muitas perdas, terrível desde o início. Pelo meio do ano já não suportava mais velórios e cemitérios. A morte à flor da pele. Meu Deus, nunca chorei tanto, maldito 1992.

Chovia, chovia, chovia...

Naquela noite dos primeiros dias de julho eu estava cercado de jovens, mas a solas num pequeno bar na esquina da José do Patrocínio com a Lopo Gonçalves, na Cidade Baixa, ouvindo uma moçada do Conservatório Palestrina fazendo bico, e a meu pedido o rapaz do violoncelo solava Adiós Nonino.

Bar pequeno, lotadinho, a moçada de 20 e poucos e eu, coroa experimentado, 39 anos, que tinha chegado por último, molhado de chuva, gravata torta, arregaçada, paletó de cor molhada, chapéu pingando, apertado de favor numa mesinha junto aos músicos. Não tinha onde largar o copo, em cima da mesinha algumas caixas dos instrumentos, deixei no chão, a moçada riu.

Quando dei por mim estava soluçando feito menino. O solista no meio da peça parou, perguntou a razão, o que foi, novo amigo? Não aguentei e disse, e... o bar inteiro desatou a chorar.

Piazzolla tinha morrido em Paris, soubera por telefone uma hora antes, sob chuva, por uma amiga parisiense, daí que, solitário, de briga com ex-amores, dinheiro curto, não dava para fugir para o Burundi ou para o Inferno, sem ter para onde ir e ser bem recebido, dei de andar a esmo pela Zé do Patrô, com ainda mais raiva do mundo. Acabou com registro de óbito em Buenos Ayres.

Ah, 1992. E naquela fria madrugada, bebendo com os moços e moças à memória do grande compositor, eu nem sonhava que no mesmo ano o pior ainda estava por vir.

Perdi o Pato, meu mano querido de infância e de toda a vida, tive eu, com as minhas mãos, que enfiá-lo numa gaveta do Cemitério João 23, até mais ver.

Depois me separei da mulher, tendo filhas pequenas, que até hoje me julgam mais ou menos mal, enfim, uma tormenta que não acabava mais, até o fim do ano, quando publiquei num jornal de Pelotas (RS), cidade que eu mal conhecia e que me tratou melhor que a cidade onde eu tinha vivido por 20 anos, no dia 31 de dezembro, por obra de amigos queridos de Regina Clara (que perdi antes, em 15 de maio), o desencanto com o ano que terminava, falando muito mal de alguém, ofendendo-o, já que a Deus, se existe, não devemos insultar, onde só na última linha se tomava conhecimento de quem se tratava, dizia: “Até nunca mais, 1992”.

A dona memória tem lá suas razões para evitar lembrar aquele ano. Morreu.

Em meados de outubro deflagrei o 38, num canalha sujo, pervertido. Até isso, morocha, mas fiz bem, para aprenderem que não podem ir entrando de sola em qualquer um, alegrões, ricaços, como incendeiam índios e pedintes, atirei sim, adeus.

A moçada do Palestrina, olhos cheios d'água, terminaram a música com fúria, e tocaram outras. Años de Soledad a penúltima, e voltaram, agora com a mocinha do violino, para Adiós Nonino.

Então, Betsabé, neste 4, agora 5, de julho me releve o nervosismo, já vai passar, sou o Bruno Contralouco, amore, tu sabe.




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