lunes, 16 de noviembre de 2015

Pecado

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A cada vez que ouço Piazzolla recordo de uma mulher, linda morena, índia de um metro e sessenta e cinco, a Mauda. Eu já com a vida melhorada, terno e gravata, apartamento pago, chapéu na cabeça, viagens pelo país, muita mulher, música... e ela me achou.

Eu morava no Alto da Bronze e ela, depois de anos me procurando arrependida, conseguiu me encontrar. Fui doce inicialmente, mas ela encontrou outro, não mais aquele menino que morava numa pensão e não tinha o que comer.

Para me agradar, depois de passar a noite me tirando o leite de todas as maneiras, como se fosse a última vez, comprou dois ingressos para um show. Ingressos disputadíssimos, custando os olhos da cara, para vermos o argentino e seus homens de preto no Teatro São Pedro, em Porto Alegre, na época lá só entrava abonados, selecionados pelo preço. Fui lá algumas vezes, mas detesto aquele lugar.

Não gosta por recalcado, me disse certa vez uma cantora, ao que tranquilamente concordei. Acrescentei: neste mundo de mentira e morte o sujeito que não é recalcado é muito burro ou filho da puta.

Um ano depois, ou dois, ou algo assim, no inverno austral de 1992, ele morreria, não tive segunda chance de assisti-lo ao vivo.

Briguei com ela por uma antiquíssima peça teatral que me aprontou, quando eu era um mulambo de rua e ela, cheia de posses e pretendentes, me mentiu, eu, hein? Disse-lhe algumas verdades, controlei-me para não enforcá-la no varal do pátio, e rasguei o meu ingresso. Até hoje não sei se ela foi ao show, no seu ingresso não toquei, só cuspi.

Saí, me bebi e acordei pela manhã lá longe no bairro Cristal, nos braços de uma nega que nunca tinha visto na vida.


Que pecado. E não um só, tremo por dentro ao dizer com todas as forças da minha alma, que desejo que ela, a querida mulher da minha vida, morra sarnenta e fedida, eu sabendo que dentro do meu coração jamais consegui me libertar do seu amor. Maldita, me mentiu, e me ensinou que não sei perdoar.


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