martes, 6 de agosto de 2013

Muralha Negra do Black Bloc, n'A Charge do Dias

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Bruno Contralouco chegou de mala ao botequim, direto do aeroporto, feliz da vida. O pessoal respirou aliviado pelo seu retorno são e salvo do Rio de Janeiro, com gaze na mão esquerda. E com um saldo de cinco meganhas quebrados, foi o que disse ao entrar.

- Voltei bonito, mas aleijei cinco! Baixa uma cerveja, Terguino!

Correu em direção ao Gustavo e ficaram de cochichos e tapas de cumprimentos. 

O Contra seguiu alegre de mesa em mesa.

- Uma vergonha, só cinco..., disse Gustavo Moscão à boca pequena para a sua mulher ao voltar para a mesa. A Jussara engoliu em seco, quietinha da silva. O Gustavo, ex-boxeador e um dos cinco que enche a mão do Contralouco em amizade de dar a vida, queria ter ido junto ao Rio, mas ela não deixou. Ficou doente, e algo lhe atormentava desde então, sentia que o Gustavo pressentiu a falsidade, um dia ele lhe jogaria no rosto: impedir-me de viver a minha vida? Minha! Ora vai proteger o teu pai, que te lavou a bunda e tu nunca telefona nem no aniversário.

O boêmio de copo na mão seguiu contando pra todo mundo que lhe abraçava sobre a gata que ganhou no Rio de Janeiro. "É mineira, muito gostosa, mora na Nossa Senhora de Copa, até guardou um troféu pra mim". Que troféu, alguns perguntavam ansiosos, ele dizia um taco de armar, ganhei na sinuca. Somente aos amigos falaria a verdade. 

Já de volta, sentado com os companheiros à mesa da janela do bar, crivado de perguntas, o ídolo da meninada respondeu algumas e anunciou, sussurrando:

- Achei meu canto! Decidi engrossar as fileiras do Black Bloc. E se eu não der uma mão o negócio não vai. Fechou todas.

Todos dobrados sobre as duas mesas, para se aproximarem, falando baixinho.

- Como assim? - perguntou a profa Jezebel do Cpers, a Idosa, passando rapidamente os olhos pelos demais companheiros, ares de ai-ai-ai.

- Sshhh... Bah, gostei que os caras querem a caveira dos bancos, mas ficam só atirando tijolinho, quebrando vidracinha... isso não adianta nada. Como tenho bronca com aqueles larápios do cor de laranja, vou encarar, já providenciei a roupa e o capuz pretos, eu não irei de toalha na cabeça, vai ser capuz, que nem polícia, mas o meu até o nariz.

- Pera, como é mesmo? Encarar o quê, perguntou Carlinhos Adeva, que estava levando um lero com um pedinte à janela.

- Pssi... Já falei de chegada, porra, os caras tem bronca com banco.

- Conta de novo, por favor, Contra, perdi...

- Ora, fiz amizade com os malucos quando salvei um desgarrado que os bandidos tinham cercado lá perto da Assembleia. O carinha valente pacas, se defendia e tentava revidar, mas eram oito contra um, covardia, e baixando o cassetete. Vi sangue no carioca. Pareciam os bandidos americanos de filme, tudo de preto e tapados de munições e o caralho. Eu só ia passando, gente, pensando em comer uma mulher na Cinelândia, chope nos barzinhos antigos e tal, depois samba na Lapa, não tive culpa, vocês me conhecem. Mas vi aquilo e me apavorei da maldade, os caras da PM são maus, dão pra matar, vi a judiaria e me deu uma coisa, quando me toquei tinha entrado rasgando, acabei com eles, ainda levei um escudo de lembrança. Como os carinhas odeiam banco, tou nessa, entendeu, vamos nessa?

Silêncio. Todos abaixados quase em cima da mesa. Aristarco ponderou, com naturalidade, ciente de que o amigo é chegado num foguinho:

- Entendo. Bronca com banco todos temos, mas daí a incendiar as agências de ladroagem vai uma distância...

- E quem falou em incendiar? Molotov já era. Tava pensando em dinamite - disse o Contra.

Gustavo Moscão e Clóvis Baixo esfregaram as mãos por baixo da mesa.

- Não adianta. Pode explodir tudo que eles mandam os seus empregados, quer dizer, presidente, governador, polícia, e prendem todo mundo, e fazem tudo de novo. Os danos o seguro paga... - murmurou Carlinhos Adeva.

Fingindo irritação, o Contra respondeu:

- Advogado é tudo cagado, bom de livrar sonegador e criminoso rico, sai fora, Carlos, vai à merda. 

E se foi de novo para a sinuca.

Passaram a confabular, enquanto ouviam a voz do Contra lá do fundo, "Peguei o cara na ida de braço erguido, ele pensou que eu ia meter a canhota e meti o pé direito nos ovos, voou...". 



O Contralouco voltou e distraiu-se discutindo o seu aperitivo com o Portuga (pediu underberg puro e o lusitano estranhou, aí ficaram discorrrendo sobre as propriedades medicinais do trago) e Carlinhos prosseguiu:

- A companhia de seguros é deles mesmos... e o grosso da indenização quem paga é o resseguro, dividem o risco, de quebra ainda recuperam com a retrocessão, não vai nem arranhar seus lucros exorbitantes.

- Como, retrosseguro? - Perguntou o Contra.

- O seguro paga os danos... -, encurtou Carlinhos.

- Mas que dano, pirou, Carlos? Não é dano, é dono. Tou pensando em explodir os donos, os banqueiros!

O Portuga se benzeu lá atrás do balcão.

- De noite vou procurar os Blocs daqui de Porto Alegre, semana que vem estarei em São Paulo - disse o futuro novo membro. Gustavo Moscão sussurrou algo em seu ouvido e Jussara o olhou feio.

- Acho que aqui não vão te aceitar... - sugeriu Jussara.

- Podem esperar, ainda vão ler no jornal sobre o muralha negra à frente do bloco... - disse com os olhos brilhando.

A um gesto de Jezebel a turma decidiu mudar de saco para mala, não convém contrariar, logo passa, se não se tocar mais no assunto talvez ele esqueça.

A meninadinha que brincava na calçada à janela do bar ouviu parte dos diálogos, logo tentaram iniciar uma nova brincadeira. Banqueiro não sabiam o que era, mas todos queriam ser o Muralha Negra. O brinquedo não saiu por falta de meganhas.

Começaram a eleição das obras do dia. Ficaram com:

Cau Gomez.



Tchó. Aqui Tigran Gdanski disse que o certo era dinamitar o Sírio Libanês. Todos concordaram, aproveitando-se de que o Contralouco tinha ido ao banheiro. Esqueceram o ouvido fino do Contra, de lá do banheiro vem a voz: - Já pensei nisso!




Fausto. Aqui foi Ain Cruz Alta quem disse que também seria bom decapitar os marqueteiros. Wilson Schu acrescentou: E quem os contrata. Leilinha riu: Mas como estão violentos hoje!




Lorildo de Guajuviras, chegado ao final das escolhas, mereceu uma a solas, por andar há muitos dias sumido. Ficou com o William.



A coordenadora Leila abraçou ao Newton Silva. Eta guria porreta.



A coluna A Charge do Dias leva esse título pelo seu idealizador, o mestre Adolfo Dias Savchenko, que um belo dia se mandou para a Argentina, onde vive muito bem. Sucedeu-o na coordenação a jovem Leila Ferro, filha do Terguino, quando os boêmios amarelaram na hora de assumir o encargo. Antes eram dois butecos, o Beco do Oitavo e o Botequim do Terguino, que.., bem..., se fundiram  no ano passado (veja AQUI), face a dívidas com o sistema agiotário. O novo bar manteve o nome de um dos butecos: por sorteio ficou Botequim do Terguino, agora propriedade dos ex-endividados António Portuga e Terguino Ferro.

2 comentarios:

  1. Ainda prefiro os ficcionistas ianques, Sr. Hans. Lá explodem tudo, bancos, joalherias, políticos, ministros...
    Grato pelo recadinho.

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