viernes, 18 de noviembre de 2011

Música na madrugada

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Voltamos, sãos e salvos. Enquanto a tigrada se ajeitava lá embaixo, largando os ferros, não todos, subi com Kafil no meu rastro para os altos da palafita. Pressentimento.

Que tristeza. Carlos deitado de costas no meio do salão, braços abertos, estendidos, falando sozinho, arma sobre o peito. Carregado o peito, e a arma.

Calmo fui no refrigerador pequeno, Kafil sumiu sem sair dali. Conhecemos Carlito, jamais nos estranharia, mas vai que a angustura com uísque tenha lhe pegado mal, que viajando em sonhos de amargura pense estar na guerra...

Me servi de um merengue e só então falei o mais doce que consigo: quieres una patricita, hermano Carlito? Eu com o merengue na esquerda e uma garrafa de patrícia na direita. Ele abriu os olhos e soltou o lamento:

- Ah, Salito, yo quiero que el mundo... y quiero escuchar Portero.

Kafil pegou o momento, foi lá e tirou a arma rapidamente, na saída deu um tapinha na cabeça, "bicha". Ufa, Carlito sorriu, aquele sorriso bêbedo, sentiu de novo o que nos une: não estamos sós.

Uma droga, quando é que Dulcemano vai tirar Betsabé da cabeça? Se a tola ficasse meio ano com ele (aguentou 3 meses, a tetéia, e se desesperou, aaaaiii), arrumava sentido para viver. Viver de verdade, não de mentira, pois parece que ela... ah.

O tango chama-se Portero suba y diga (1928, Eduardo de Labar e Luís César Amadori).

Na versão brasileira, interpretada por João Dias (vítima do sistema, ainda falaremos dele) era só "Porteiro" mesmo.

O vinil das suas recordações do Velho tem como cantor Rodolfo Lemos. O Velho tinha muitos vinis, Carlito os carrega como cruz desde sempre, atualmente mal começa a perdoar aquele bêbedo palhaço de circos interioranos, que o sustentou até os cinco anos num Uruguay destruído. A dor do arrependimento: Carlito já sabe, e não consegue expelir, que o Velho bêbedo valia mais que todos os ministros de qualquer parte do mundo. Muito mais, pela sinceridade e por fazer o que Jesus Cristo teria ensinado.

Vou lá, deito junto no meio do espaço central, Kafil desliga as luzes. Abraço-o e digo baixinho: "Tá, ouve o tango e dorme, amanhã precisamos muito de ti". O forte tremor do corpo... depois o sacudir leve da cabeça me diz que sim.

Carlito tem música na alma. Não finge de viver. O Velho era o pai dele, claro. Porteiro de cabaré, único jeito de trabalhar depois de ter matado alguém que estuprou sua filha mais velha, um deputado. O Velho que morreu sem saber da sorte que teve muitos anos depois, a sorte de ter um filho desde el alma.

Tintim, Carlito, duerme.





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